quinta-feira, 25 de junho de 2015

Relativamente à iniciativa dos pró-vida...

Que fique registado que este blog não tem, nem terá, quaisquer presunção de ser uma autoridade em relação à legislatura e constituição, se andam neste meio de blocaria sabem bem onde se podem deslocar.

No entanto, ao ler sobre uma proposta de voltar a criminalizar a IVG choca-me, nunca fui grande fã do Rebelo de Sousa, vá não viro para o mesmo lado dele e o senhor professor tem muitos seguidores não precisando de mim e não surpreende que ele esteja entre os signatários desta proposta.

Nesta vida, não nasci mulher, não posso fingir que sei o que é ser mulher porque não sei, sou um homem caucasiano cis e que tem privilégios mesmo fazendo parte de uma minoria.

A minha mãe lutou contra todas as forças e bom senso na década de setenta para ser mãe, a nascerem todos eu seria o sétimo filho, os outros simplesmente não nasceram porque o corpo dela até então não permitia, era como um enxerto mal sucedido, um transplante rejeitado e todos os fetos (com excepção de um que não o que viria a ser eu) não ultrapassaram os 4 meses de gestação. Reza a lenda que quando a minha mãe engravidou daquele que viria a ser o filho do vento que vocês lêem, o médico falou com ela nos limites que por vezes nos oferecem e que, a ser mal sucedida, ela deveria pensar em adopções falou até em "comprar" porque havia muita gente que fazia.

Na altura do parto, prematuro, e porque ambos corríamos risco de vida, o médico perguntou ao meu pai quem é que salvava e a resposta foi "A mãe.", na verdade acabou por correr bem e a teimosia que caracteriza a minha mãe (e que o filho herdou) conseguiu o que pretendia, ser mãe. Depois, voltou a engravidar, e existiu uma IVG porque a minha mãe não tinha condições de saúde para levar a gestação a termo. Na altura, foi considerada uma IVG legal. Aquilo que pretendem fazer é voltar a criminalizar e condenar a IVG, retirar-lhe a possibilidade de baixa, de justificações médicas e violar aquilo que é um direito da mulher.

Qualquer pessoa que diga que o a IVG é apenas um método anti-contraceptivo é um perfeito imbecil, salvo raras excepções (e que não devam ser tidas como regra) não é uma decisão que eu acredito que a mulher tome de ânimo leve. Obrigar uma mulher a ver imagens da ecografia, tratar o feto por bebé é de uma crueldade inominável e só a culpabiliza cada vez mais.

Eu acredito que a mulher tem direito a escolher o que fazer com o seu corpo, é preferível que uma criança nasça de amor do que uma obrigação, o corpo é da mulher, a decisão é da mulher e esta gente pró-vida que fazem parte, na maioria das vezes, da classe alta e privilegiada mete-me nojo, esta pseudo-moralidade em prol de uma vida que depois nenhum deles se interessa em que meio é que vai nascer, se a mãe tem condições para o criar (e não me falem das instituições, pode ser?), se a criança vai ser amada e vai ter direito a tudo o que as crianças devem ter.

Já não bastava fazerem piquetes nas clínicas, esta gente aproveita-se do governo que temos para, em termos de direitos, andarmos novamente para trás, não agora apresentam isto na AR e são sempre os mesmos, que Hécate seja soberana e traga à praça público tudo aquilo que eles escondem mascarados de moral, bons costumes e direito à vida, é o que lhes deseja, que assim seja.

8 comentários:

  1. Uff! Emocionaste-me.
    Este é um retrato da vida real, que é dura é difícil, e não um conjunto de considerações moralistas de quem se acha superior e sabe o que é melhor para os outros.

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    1. Até porque, numa classe alta, os abortos irão continuar a existir sendo realizados por médicos de "confiança" ou noutros países.

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  2. Sabes, abordas um tema que me é muito caro. Em primeiro lugar porque estive quase para ser "abortado", não o sendo porque o "coração já batia" e porque a mãe receou ir à tal clínica em Cascais. Contei isto no blogue e, salvo erro, comentaste. Em segundo lugar porque é um assunto de uma complexidade tal que me parece que nem cem páginas, para mim, chegariam. Há uma imensidão de aspectos a analisar.

    Fui, por muito tempo, partidário da IVG. Recordo-me de ainda não poder participar no referendo de 2007, mas de dizer que, assim pudesse votar, fá-lo-ia no "Sim". Entretanto, com o avançar dos anos e amadurecendo - e sem quaisquer considerações morais em causa - percebi que estávamos perante duas vidas, a da mulher e a daquele embrião ou feto, consoante o estágio da gravidez. Porque vida é. Podemos discutir se sentirá alguma dor, mas é vida, ainda que seja uma vida celular no início. Originará, no termo da gestação, um bebé. Há, portanto, um conflito. Devo dizer que é um assunto sobre o qual não consigo tomar uma posição. O direito protege a vida intra-uterina, daí que o aborto continue a ser um delito, e com previsão no Código Penal. O que temos é a IVG, que é diferente. Trata-se de um interrupção lícita e voluntária da gravidez, que já as havia lícitas em determinados casos, como o perigo para a vida da parturiente, malformação do feto, etc.

    Sou contra o que está em causa. Parece-me ofensivo da dignidade da mulher. Ter de olhar para a ecografia, o que parece que já acontece, é doloroso. E depois assinar...

    Isto para dizer que não sou contra ou a favor do aborto, pelo menos por enquanto. Há um conflito de consciência sério. Não sou indiferente ao direito que a mulher tem de dispor do seu corpo, mas também não posso, eticamente, e não tem nada que ver com o facto de ser jurista, ser indiferente à vida que ali está. É vida. Mesmo podendo ainda nada sentir, indiscutivelmente originará um ser humano na maior parte dos casos. Havendo um conflito entre direitos, até o bom senso nos leva a decidir pelo que valerá mais, que é exactamente onde não se encontra consenso.

    Obrigado pela menção no primeiro parágrafo, que despretensiosamente entendi dirigida a mim, mas olha que não sou autoridade nenhuma seja em que matéria for. Sou autoridade e senhor apenas da minha consciência, e o que escrevo fundamento com o que sei e com o que penso. Apenas isso. :)

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    1. Mark, quando escrevi este texto recordo-me do teu post, recordo-me também que foi uma decisão da tua mãe e que, do que escreves, tentou proporcionar-te o melhor tipo de vida e conforto.

      Nem sequer vou falar de situações de violação, nem sequer vou falar de situações que uma mulher engravida tomando todas as devidas precauções de planeamento familiar, a pílula, o DIU, o implante, todos são métodos falíveis (com taxas baixas, mas falíveis) e temos que olhar para a situação do país. O estado não tem condições mínimas para um y número de crianças indesejadas. Percebo a vida, porque a respeito, mas tão importante são as condições que damos a essas crianças e a vida propriamente dita que irão ter.

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    2. Tratando-se de abuso sexual, a lei permite a interrupção da gravidez. Aliás, já permitia. Não seria admissível exigir-se que uma mulher levasse até ao fim um gravidez fruto de uma violação sobre o seu corpo. Seria duplamente humilhante.

      Lá está a incoerência do ordenamento jurídico anterior à IVG de 2007: estava proibida, mas, nomeadamente em caso de crime contra a autodeterminação sexual, permitida até às 12 semanas. Se atendermos unicamente à valoração do bem jurídico "vida", vale tanto a do embrião fruto de uma gravidez desejada quanto aquele que é fruto de um crime de abuso sexual. Nesse sentido, a IVG é mais coerente. Não totalmente, porque, vejamos, em caso de abuso sexual estende a interrupção às 16 semanas; por opção, 10. Ora, o bem valerá tanto na décima quanto na décima sexta semana. Não admira que tantos médicos aleguem objecção de consciência, escusando-se a participar na IVG. Daqui excluímos todos os casos de interrupção para proteger a integridade física e a vida da mulher. Há países onde nem isso.

      Eolo, sei ao que te referes, mas os interesses do Estado aqui não têm cabimento. Livrai-nos de um Estado que permita a IVG atendendo à sua sustentabilidade! Isso abriria portas para situações terríveis. Nem quero imaginar o que aí viria...

      Pronto, não encho mais o teu espaço destas observações enfadonhas. :)

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    3. Mais informação nunca fez mal a ninguém.

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  3. Grandes testemunhos Eolo e Mark. Vocês trazem duas realidades que embora diferentes na abordagem, juntam-se no tema. Não acredito que as mulheres usem o aborto como método contraceptivo e que o façam de boa vontade. Ninguém chega a um hospital e diz "olhe é para tirar, sff". Mais do que o direito a nascer, estamos perante uma guerra ideológica que algumas pessoas querem impor às outras. Curiosamente a malta que tem posses de educar os filhos (sejam eles quantos forem) acham que têm o direito de querer que todos nasçam independentemente da origem. Nunca ouvi dizer que queriam dar dinheiro a todas as mães que queiram ficar com os filhos e que lhe pagaram a educação até à maioridade.

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    1. A taxa IVG desceu desde a legalização. E sim, essas pessoas dizem que o Estado tem perfeitas condições para dar às crianças o que elas merecem, mas se calhar o que elas merecem na cabeça dessas pessoas é discutível.

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