quarta-feira, 4 de novembro de 2015
Deixem-nos ser fracos...
Este ano assisto infelizmente a perdas de entes queridos dos meus amigos, de pais, avós, tios e tantos outros que amamos e que de um dia para o outro perdemos.
Nunca digo nada na altura da perda, não há nada a dizer, mas ouço constantemente o "força" que me enoja por muito boa vontade que tenha, deixem-nos ser fracos, deixem-nos chorar as nossas perdas, deixem-nos aprender a viver com aqueles que amamos de outra forma.
Bem sei que os que nos rodeiam querem que deixemos de sofrer mas sofrer faz parte do ritual da separação é um comportamento que tem tanto de amoroso como de masoquista, é aquele punhal invisível que nos recorda continuamente que nós continuamos cá e eles não.
Nunca digo "força", digo "estou cá para o que quiseres", nunca pergunto como foi, como foi e o que durou porque lembro-me da passagem da minha avó lembro-me de contar a mesma história em modo repeat e só me sentia rodeado de abutres. Numa cultura que não nos ensina a lidar com a morte é normal que quando confrontados com ela queiramos saber até porque nada sabemos do que está para além do véu mas quem conta os pormenores revive tudo, lembrem-se dos que ficaram quando já passaram os ritos de velórios e funerais porque se nuns estamos anestesiados emocionalmente ou ocupados com tarefas mundanas e burocracias quando tudo acaba ficamos só e temos que lidar com o sentimento do vazio e, quanto a mim, nunca sei o que fazer e preciso que me obriguem a mexer e a sair, a falar se me apetecer falar mas não me peçam por ter força porque ela apenas virá como dor renascida com se algo nos impelisse a continuar em frente, a aprender a viver sem o que é tão importante, mas primeiro precisamos de chorar e voltar a chorar quando acharmos que já chorámos tudo.
Quando me disseram força senti-me profundamente constrangido, sentia que a minha fragilidade incomodava e que tinha que ser forte porque as pessoas não sabiam lidar com o meu sofrimento. Soa-me a um acto de egoísmo, de machismo, porque quem choram são as meninas e não há nada pior do que parecer frágil e feminino.
Podem dizer que não sabem dizer outra coisa, então não digam nada, ofereçam ajuda, ofereçam comida feita com amor porque mesmo que não se coma hoje há-de ser comida e se feita com amor há-de aquecer a alma mesmo que não nos apercebamos.
Continuo a lidar de forma estranha com a morta, que se manifesta pelo cheira, pelos sonhos e se apresenta quando já não há nada a fazer, odeio-a e revolta-me e depois percebo-a e depois faz parte do caminho mas não deixo de ser egoísta e ter querido um pouco mais de tempo sabendo que todo o tempo que ela me pudesse oferecer seria tão pouco porque o tempo contado passa rápido.
Com a passagem de Samhain fui revisitado pelos meus que estão vivos na centelha divina da minha alma e revejo-os em pequenos gestos, aromas, sabores e sensações, amo-vos hoje e sempre.
Pela minha experiência de vida, pelas perdas já vivenciadas, pelas trilhas percorridas, não temo a morte. Vejo-a como algo natural, tão natural qto nascer. O que temo é tão somente a possibilidade do sofrimento físico nesta hora.
ResponderEliminarAcho que todos tememos o sofrimento físico, não é o acto em si é a forma.
EliminarTal e qual, revejo-me tanto nas tuas palavras.... O silêncio, um olhar, um abraço foram tão mais importante que tantos "força" que ouvi e que me soaram tão ocos.... Beijinhos
ResponderEliminarBeijinhos para vocês.
EliminarNessas situações prefiro a empatia à simpatia aprendida socialmente.
ResponderEliminarA simpatia muitas vezes é oca.
EliminarCada um tem a sua forma de lidar com a dor e com a ausência de quem gostamos.
ResponderEliminarA vida é feita de ciclo e custa sempre e não nos esquecemos deles.
Eu não me esqueço dos que passaram e tenho a certeza que todos somos assim.
EliminarPercebo o teu lado, mas não recrimino que diz "força". Quando é sentido o que é dito isso passa para segundo plano. A verdade é que a dor nunca desaparece, apenas ameniza com o tempo, mas a saudade impede que nos esqueçamos de quem verdadeiramente nos faz falta.
ResponderEliminarSão maneiras de ver as coisas, ouvir cinquenta vezes força num dia atenua todo e qualquer efeito pretendido.
EliminarEstaremos vivos enquanto nos amarmos.
ResponderEliminarBeijo
Beijo grande.
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